domingo, 4 de abril de 2010

Ressaca...

Sinto no peito uma dor, nos meus braços uma carência, sinto em mim uma ausência. Como se de uma droga te tratasses sinto a tua falta borboleta. O vazio que se cria de um dia a teu lado para o dia seguinte onde me enrolo na cama à procura ainda de uma réstia do teu aroma, de um pedaço de memoria que me faça esquecer a solidão, aumentada pela tua presença recente perto de mim. Faz-me ainda mais falta o teu calor, o som da tua respiração, o acordar espontaneamente e ver-te ali, a meu lado, o sentir-te disponível para mim, para nós a qualquer momento. Sinto falta dos teus gritos de paixão, do teu lado selvagem por trás desse teu ser de borboleta frágil e bela, distante por vezes do mundo.
...
Quem é a borboleta?!
É um ser especial...
...
Tanta vez te sinto voar bem longe de mim mas o carinho que tenho por ela faz-me sorrir por me parecer feliz, no entanto, a um olhar mais atento, quando me aproximo vindo de longe continuo a ver que aquela borboleta frágil e simples que voava lá ao fundo descrevendo movimentos de liberdade continua presa, fechada.
Uma leve túnica de seda translúcida isola-a de tudo o resto e quando ela, a borboleta, se deixa por momentos levar na brisa da vida, rapidamente se esbarra nos seus limites. Apetece-me com um gesto quebrar essa barreira, contudo, apesar de quase indestrutível quando sinto abrir uma pequena brecha suficiente à fuga daquele ser intrinsecamente belo, estranhamente num gesto de dúvida e quase pavor é ela mesmo que com restos de seda do seu casulo vem remendar e fechar a possível saída. Os seus olhos grandes e sublimes, carregados de dor e paixão num sentimento ambíguo olham cá para fora com vontade de viver, de correr o mundo, de viver plenamente sem barreiras. De seguida vejo-a fechar os olhos e viver esse mundo cá de fora lá dentro, num sonho acordado de ilusão.
Então secretamente aprendi por vezes a entrar no seu espaço, aprendi a voar, aprendi a sorrir dentro do seu mundo, da sua clausura. Falo-lhe da vida cá fora, quero-lhe mostrar mais, muito mais, digo-lhe e mostro-lhe aquilo que existe, juntamos as mãos e por momentos sinto o seu carinho, a sua paixão e é então que espreito pela brecha onde entrei trazendo-a ainda pela mão, encho-me de coragem e trago-a comigo... Mas ao passar sinto um aliviar nos meus dedos, sinto-a escorregar... Ela ficou lá dentro e com um ar de quem nada quer dizer fecha-se e remenda novamente a abertura por onde entrei.
Fujo. Afasto-me. Corro à mais alta velocidade para longe, bem longe, olho à minha volta e vejo outros seres, alguns igualmente belos por fora , cheguei a parar uma vez por instantes, mas como qualquer droga, qualquer paixão cria-se um ardor no peito, um estado de ansiedade, desespero e necessidade de algo inexplicável, algo único e intrínseco que encontrei naquele ser. Penso que o mundo é grande e sigo novamente em frente, deixando tudo para trás, passo por sítios sem olhar, noutros abrando e contemplo meu redor para novamente acelerar o passo à busca de uma cura... até que um dia, ao fundo na neblina... Vejo uma borboleta igualmente bela, o bater das suas asas exprimem alegria, paixão, vontade de viver. Lentamente e com vergonha aproximo-me mais por entre o nevoeiro, observo a sua vivência própria de gáudio, de diversão, de prazer com a vida, a sua boa disposição, tal como a borboleta que conhecia e me corroía o ser... Dei dois passos em frente e senti na cara algo como se estivesse a passar nas teias de uma aranha, tentei quebrá-la e limpar o rosto... Para meu espanto não era uma teia, nem muito menos se depositou na minha cara.
Era um manto... translúcido de seda camuflado pela neblina daquela manhã... Haveria já dado a volta ao mundo e aquela borboleta que encontrei era a mesma que conhecia... Decidi parar de correr e sentar-me longe... mas à vista, à espera que um dia a borboleta saia e poise no meu ombro...